Aline Fiamenghi

Estudo preliminar sobre a função poética

Aline Fiamenghi

A partir de Jakobson (2003) entendemos a poética como uma estrutura verbal que faz parte da linguística. Nessa estrutura o enfoque na mensagem é a função predominante. Essa mensagem deriva principalmente do som, “soa melhor assim…”, do acento e do ritmo. Portanto, não se pode isolar a função poética da fonética.

Em uma aproximação que nos interessa, Valéry (1957), sugere que a poética estaria mais próxima a poiesis (um modo específico do fazer grego, “trabalho poético”) do que da poesia como a conhecemos formalmente.

A função poética não se confunde com poesia. Contudo, elas se encontram na combinação fabricada, construída, na hesitação entre som e sentido (Valéry, 1957) e  no uso da metáfora – que tem raíz metonímica e produz ambiguidade e pluralidade de sentidos. A função poética torna a função referencial ambígua.

Podemos pensar aqui a palavra-valise não como representação de algo escondido, mas a mensagem como a própria capacidade metafórica de se desdobrar em múltiplos sentidos. As palavras-metáforas reverberam em novos sentidos a partir de seu som, para além das analogias. Podemos pensar no célebre e poético exemplo da interpretação de Lacan a partir do significante de sua paciente “Gestapo”. Presa a angústia que a fazia acordar durante a noite a partir desse significante, Lacan lança mão do equívoco provocado pelo som: de Gestapo  à gest à peau, intervenção acompanhada de um gesto em ato. Interpretação em ato.

No Seminário 23 ele alerta: “ É unicamente pelo equívoco que a interpretação opera. É preciso que haja algo no significante que ressoe … O equívoco é a única arma contra o sinthoma.”

O sujeito neurótico tem uma versão da realidade fixada a partir da sua fantasia. A significação é sempre a mesma. A intervenção do analista, na direção do equívoco, do enigma e da repetição do “não há relação sexual” descontinua, abre, explicita que não há acesso ao 2, não há razão.

Segundo Bousseyroux nascemos poema como falasser. No entanto, não há ainda poeta, pois o que se apresenta é o saber sem sujeito do insconsciente-lalíngua. Trata-se de um poema sem sujeito. Por este motivo, Lacan enfatiza que nasceu poema, mas não-poeta [papouète], pondo em jogo lalíngua.

Para o autor a determinação poética produz sentido e ocorreria a partir das possibilidades fônicas da língua, se valendo das figuras de equiparação fônica como a paronomásia, o anagrama, a onomatopéia e a sinestesia, considerando que apareceria um efeito de sentido partindo da equivalência entre sentido e som, como “a atualidade dos fatos do real de lalíngua, e não o efeito da retração temporal do significante no simbólico” indicando uma interpretação pela via da função poética. Aqui começa este estudo.

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